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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Corpo seco

         A pessoa que fazia maldades na vida, quando morria, nem a terra aceitava e jogava o corpo para fora.
         A pele do morto rejeitado secava em cima dos ossos, mas o cabelo e as unha continuavam a crescer normalmente. Ele virava uma criatura horrível, assustadora.
         O corpo seco voltava para o lugar onde tinha vivido e não saia mais de lá.
         Certa vez um senhor que procurava terras para comprar, se deparou com um sitio a venda a preço de banana, era tudo que ele queria e precisava, comprou, não queria perder a oportunidade.
         Na época, o rapaz achou que tinha feito um ótimo negócio. O sítio tinha uma boa casa, baias, lago para pesca e até um pomar.
         Mas a sua alegria durou pouco. No dia em que tinha resolvido mudar para o local, começaram a acontecer umas coisas estranhas.
         Primeiro ele tentou entrar pela frente da casa. Girou a chave, a fechadura destrancou, mas a porta não abriu o senhor empurrou a porta que já estava destrancada e nada, ela nem se moveu.
         Então ele teve a idéia de entrar pela a porta da cozinha, destrancou a fechadura, mas ela também não abriu. Dali a pouco começou uma ventania tão forte que carregou até o seu chapéu, levando para bem longe.
Desconfiado o senhor foi até a cidade para assuntar sobre o acontecido com aquele sítio.
         No mercado municipal ele entendeu porque tinha pagado uma ninharia. Contaram para ele que naquela casa morava um corpo seco, era um fazendeiro muito ruim, uma praga na sua época de vivo.
         O senhor voltou ao sítio, decidido a negociar com a assombração. De fora da casa, ele ofereceu tudo: missa, cavalo, jóias, viagens e até dinheiro vivo, mas de nada adiantou.
         As portas não abriram e, para, piorar, a ventania voltou ainda mais forte.
         O senhor já estava desesperado e foi ai que lhe falaram de uma benzedeira muito famosa na redondeza. No mesmo dia ele procurou a mulher. Então ela disse o que era para ser feito e lhe deu um patuá.
         O senhor encomendou uma tesoura de prata, a única que o corpo seco aceita, e voltou ao sítio assombrado.
         Chegando lá, gritou:
         - Boa tarde, seu corpo seco. Hoje eu trouxe uma tesoura de prata, do jeitinho que o senhor gosta, para cortar as suas unhas e o seu cabelo.
         Imagine se a criatura não ia gostar? Tantas décadas naquela casa, com unhas enormes e um cabelo que não parava de crescer.
         O senhor segurou bem forte o patuá, se benzeu e conseguiu entrar pela a porta da frente, que na mesma hora se abriu sozinha.
         Quando ele chegou na sala, avistou o corpo seco sentado no sofá, com a cabeleira batendo no chão e as unhas parecendo ganchos.
         Ele se aproximou e já foi tirando a tesoura de prata do bolso. O corpo seco mostrou primeiro os cabelos, e o senhor já foi logo cortando, encerrando foi à vez das unhonas.
         Assim que terminou as unhas da mão direita, ele disse para a assombração que precisava ir a um casamento, mas voltaria no dia seguinte.
         A criatura ficou desapontada, mas não tinha o que fazer.
         No outro dia, o senhor voltou ao sítio e de fora começou a prosa.
- Seu corpo, boa tarde. Eu vim, conforme o prometido, mas tenho uma coisa para lhe fala.
Silêncio.
- Eu só corto as unhas da mão esquerda, se o senhor se mudar para aquele sítio, que também era seu, lá no morro, bem afastado de tudo.
- Silêncio.
- O sítio está abandonado, não tem ninguém morado lá, a casa está mais conservada que essa e o lugar é bem sossegado, o senhor deve se lembrar bem.
- Silêncio.
- Estou aqui á disposição, para levar o senhor até a sua outra casa. Aporta se abriu. Saiu o corpo seco de lá e montou nas costas do senhor.
Todo ano, por vias das dúvidas, o esperto senhor subia o morro e ia cortar as unhas e o cabelo do corpo seco.
Esse era o jeito de garantir que a criatura não voltaria pra casa antiga, afinal, nunca se sabe o que se passa na cabeça de uma assombração.

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